O Bispo de Leiria-Fátima apresenta a Carta Pastoral “A beleza e a alegria de viver em família” como documento orientador para o próximo biénio pastoral, dedicado à pastoral familiar.
Nesta Carta, o Pastor começa por recordar a “graça” que foi o périplo de visitas pastorais que efetuou por todas as paróquias da Diocese, entre 2008 e 2013, onde encontrou “nas diversas comunidades muitos homens e mulheres de uma grande fé, de incansável dedicação à Igreja e à vida da comunidade, de generoso serviço aos necessitados”, incluindo “os irmãos sacerdotes” no trabalho dedicado nas suas paróquias.
“Confesso que me sentia pequeno perante a fé e a dedicação destas pessoas e, por vezes, me comovia até às lágrimas”, diz D. António, completando que são elas que, “com a sua entrega, dinamizam a vida das comunidades nos diversos âmbitos” e que “a sua formação merece um cuidado especial”.
Aí contactou com agentes pastorais, coletividades, autarquias, empresários e profissionais e sentiu “o grande espírito empreendedor e solidário que distingue esta região”, mas identificou também “problemas e desafios” como “a fé vivida por uma questão de tradição, o afastamento de adolescentes e jovens após o Crisma, a falta de vocações sacerdotais, (…) a grande dificuldade da Igreja em sair de si mesma e ir às periferias, entrando em diálogo com o vasto mundo, abrindo portas e construindo pontes”.
Essa experiência revelou também as “situações difíceis em que algumas famílias se encontram e do seu sofrimento”, refere o Bispo, justificando a pertinência de centrar a ação pastoral do próximo biénio “na realidade da família que nasce da união conjugal de amor entre o homem e a mulher no sacramento do Matrimónio”. Concretamente no ano 2013-2014, sob o lema “Amor conjugal, dom e vocação”, realçar “a beleza e a riqueza da família que vive o Matrimónio cristão com amor sincero e profundo, fiel e coerente, como dom de Deus”.
(Re)descobrir e testemunhar a beleza da família
Numa primeira abordagem, o Bispo diocesano parte da experiência humana da família como “célula fundamental da comunidade humana” que sofre as contingências das “profundas transformações sociais e culturais do nosso tempo”. Nomeadamente, o facto de se privilegiar “o momento presente, a cultura do provisório, do efémero e do descartável, que leva à dificuldade em assumir compromissos duradoiros e definitivos”, levando a “uma mentalidade que desacredita o próprio casamento, religioso ou civil, como se fosse antiquado e, portanto, fora de moda” e que “já nem sequer entra no projeto de vida de bastantes jovens”. Por outro lado, reduzir “o amor e a própria vida familiar ao mundo de afetos, sentimentos, emoções espontâneas” acentua a “dificuldade de compreender a dimensão social do Matrimónio e da família”, o que se reflete no “receio de ser pai e mãe (…) e na quebra da natalidade e da renovação das gerações”.
Estas e outras questões, como “a banalização do divórcio e do aborto, uma chaga social (...) que está na origem de muitos dramas familiares”, ou “as novas tecnologias e a cultura digitais que entraram na vida familiar” são “um dos maiores desafios para os cristãos e para a Igreja do nosso tempo: (re)descobrir e testemunhar a beleza, a grandeza, a riqueza e a dignidade do Matrimónio e da família como dom de Deus e missão ao serviço da felicidade da pessoa, da sociedade, da Igreja e do mundo”.
Vocação ao amor “lida” na Bíblia
Para essa descoberta, D. António aponta a fonte bíblica do Génesis, onde se apresenta “o mistério da criação e o projeto que o Criador acariciou como seu ideal e que propôs à liberdade humana”, e das bodas de Caná, onde se descobrem “alguns ‘pontos luminosos’ que põem em relevo os traços do Matrimónio cristão e da família que dele deriva”. A partir daí se descobre o Matrimónio como vocação, isto é, “não é um facto meramente humano, sociológico, casual”, mas “um chamamento que contém um dom, um projeto e uma missão para o homem”, em que os dois são “uma só carne” em comunhão fecunda do amor que se entende aos filhos.
Esta consciência deve começar logo no namoro, onde poderá haver “miragens, pensamentos egoístas e apressados (…) confusão entre o desejo e o amor”, alerta o Bispo, pedindo os esforços educativos da família, da escola, da catequese, dos grupos de jovens, das comunidades cristãs e dos movimentos apostólicos para “oferecer às crianças, aos adolescentes, aos jovens e mesmo aos adultos, com a pedagogia do próprio amor, o conhecimento deste extraordinário dom divino e ajudá-los a descobri-lo e a acolhê-lo pessoalmente com alegria e confiança”. Depois, consolida-se no matrimónio cristão, em que o elemento mais profundo “é a consciência do casal ser sacramento ou sinal, imagem viva e instrumento da ternura e do amor de Cristo pela humanidade, precisamente, através do amor de um pelo outro, pelos filhos e do testemunho de amor aos outros e de serviço à sociedade”.
Esta descoberta é fundamental e para ela “devem contribuir as iniciativas das comunidades cristãs, da pastoral familiar, dos movimentos de casais existentes na Diocese e de quantos o possam fazer também”, conclui D. António Marto.
Família na Igreja e na sociedade
“A família é o fruto e o testemunho precioso da beleza e da fecundidade do amor conjugal”, lembra a Carta Pastoral, num capítulo onde desenvolve a questão “natureza relacional” do agregado familiar como “lugar privilegiado onde (…) o amor pode ser vivido de forma estável, gratuita e generosa”. Nesse ambiente, a “fecundidade do amor conjugal tem uma expressão privilegiada na procriação generosa e responsável”, que requer “o cuidado amoroso em acompanhar o crescimento físico e espiritual dos filhos, particularmente, a sua educação atenta e sábia para os valores humanos e cristãos” e que começa logo na promoção da “cultura da vida, face à banalização do aborto”. Uma das funções educativas é, precisamente a transmissão da fé, cabendo à família “tornar-se comunidade de fé, de graça e de oração, escola das virtudes humanas e cristãs, lugar do primeiro anúncio da fé aos filhos”. Nem os avós são esquecidos, pois, “tantas vezes, são eles os que fazem a primeira iniciação à fé aos seus netinhos”.
O apelo de D. António neste campo é que os agentes pastorais “ofereçam aos casais e às famílias oportunas propostas formativas e outras iniciativas que os ajudem na sua vida e missão próprias”, sendo pedido às famílias que se “associem e colaborem em iniciativas, quer para alcançarem uma boa educação para os seus filhos, quer para partilharem com outros o testemunho dos bens e valores cristãos que animam e enriquecem as suas vidas”.
Vivendo assim, o cristão encontrará na família o seu caminho para a santidade. Certo de que não vivemos numa “sociedade perfeita”, o Bispo de Leiria-Fátima lembra que este é um itinerário para toda a vida e que não devemos ter medo das dificuldades para atingir um ideal tão alto, já que este é “um longo caminho de integração, de aceitação, de ascese, de aprendizagem, muita capacidade de perdão e muita paciência e perseverança” e será a própria graça do Matrimónio a dar a “força para percorrer como casal o caminho comum”. Uma 'arma' à sua disposição será a “oração na e pela família", pois “um Matrimónio sem espiritualidade é como um corpo sem alma, ou como uma planta sem água e sem sol”.
D. António Marto não esquece também as situações de “ruturas na família”, como nos casos de separação, divórcio, novo casamento civil ou matrimónio nulo, apelando a “uma pastoral de diálogo e de misericórdia”, em que a comunidade cristã deve ser uma ajuda, “salvaguardando a identidade do Matrimónio fiel, livre e indissolúvel que a Igreja não pode modificar”, mas também “imitando a atitude da misericórdia de Jesus na atenção às situações concretas e diversificadas”.
Pistas para a pastoral familiar
Ao longo de todo o documento, o Pastor vai indicando algumas orientações pastorais práticas, como, por exemplo, “valorizar o Retiro Popular sobre este tema e a celebração dos dias litúrgicos de caráter familiar (Sagrada Família, Dia da mãe...), bem como a celebração dos jubileus dos 25 e 50 anos de Matrimónio a nível diocesano”.
No final, concentra algumas indicações sobre a Pastoral Familiar a desenvolver, pedindo que acompanhe as famílias “em todas as fases da sua formação e do seu desenvolvimento, em todas as estações da vida, desde a preparação para o Matrimónio”, não só a nível central, mas em cada paróquia e vigararia, “escolhendo e convidando pessoas para constituírem um grupo organizado que trabalhe em coordenação com o departamento diocesano”. Para tal, deve apostar-se na “formação adequada” de quem trabalha neste setor, bem como na “coordenação entre as paróquias, os movimentos, as associações e outras comunidades que se dedicam a esta causa” e num “trabalho de mais vasta informação e divulgação”.
(Fonte: Luís Miguel Ferraz | GIC Leiria-Fátima)