Caros cristãos do nosso Arciprestado,
A grande festa do Natal, que celebraremos dentro de poucos dias, é tradicionalmente uma época que nos interpela, particularmente, à solidariedade e à partilha do que temos em favor dos menos favorecidos, num múltiplo e crescente proliferar de várias campanhas e iniciativas de cariz social que chegam até nós das mais diversas formas.
No entanto, sabemos que os pequenos gestos de partilha que possamos praticar nesta época nem sempre provocam em nós, no mais íntimo do que somos, a transformação profunda desejável e que se torna um imperativo incontornável para uma vivência plena e frutífera da Fé que professamos.
De facto, mais do que um gesto pontual de doação de algo, precisamos de, à semelhança do desafio que abraçamos ao longo do caminho de Advento, ter a coragem de deixar que o Amor germine em nós! Para tal é necessária uma conversão de vida, respondendo ao apelo de João Baptista proferido nas margens do Jordão! Precisamos reaprender a humildade de ser simples, como um vaso de barro que se esvazia de si mesmo para, vigilante, se dispor para “apenas” servir! É necessário ser terra fértil que se prepara para acolher nas suas entranhas a semente que nos irá mudar para sempre, restaurando-nos numa alegria sem par! É preciso ser semente que repousada na húmida escuridão da terra se anula a si mesma para dar vida nova, fecunda e abundante, regada pela água refrescante da Fé que sempre nos restaura e alenta! Só assim, na vida de cada um de nós, se cumprirá o prenúncio alegre e reconfortante de Isaías: “Como a terra faz brotar os germes e o jardim germinar as sementes, assim o Senhor Deus fará brotar a justiça e o louvor diante de todas as nações” (Is 61, 11).
Germinar no Amor implica, efectivamente, uma mudança exigente e profunda, implica que toda a nossa vida seja oferta de amor permanente e perene! Não basta oferecer um determinado bem material e depois regressarmos à nova vida, mergulhados nos nossos interesses mesquinhos, nos nossos caprichos consumistas ou na nossa indiferença gelada e paralisante! De que adiantará a oferta de algo de que até podemos dispor sem grande esforço ou renúncia, se depois na nossa vida de todos os dias, na família, no trabalho, na escola, na paróquia ou no grupo de amigos não vivemos como crentes e baptizados e parecemos ter um Fé morta, ou pelo menos adormecida e apática, que pouco ou nenhum fruto produz? Não deixa de ser paradoxal que às vezes nos seja mais fácil oferecer um pacote de leite ou um pão do que um simples, mas libertador e reconfortante, sorriso, ou um terno e quente abraço ou ainda um pedaço do nosso tempo para estar com alguém que mais do que precisar do que temos para lhe dar, precisa de nós, da nossa presença, do nosso afecto!
A este propósito, apraz-me recordar S. João Paulo II que, durante o seu pontificado, referiu em vários dos seus escritos a urgência de uma “nova fantasia da caridade”, na medida em que não bastará amar os outros, mas “inventar” novas formas de os amar e de nos darmos sem reservas aos mil e um cuidados desse amor e à prática de todas as obras de misericórdia!
Jesus é, caras amigas e amigos, o Amor verdadeiro que, no Natal, precisa germinar em nós… Ele é o Amor maior e inesgotável, mas ao mesmo tempo interpelativo, capaz de nos desinstalar e de nos tornar inventores criativos dessa “nova fantasia da caridade”! Jesus é o Deus feito homem, “o Verbo feito carne que veio habitar entre nós” (cf. Jo 1, 14), para que possamos experimentar a alegria do encontro com Ele, Salvador do mundo, e para nos desafiar a sair ao encontro de todos os irmãos, sobretudo dos que mais sofrem e que nestes tempos, particularmente austeros e sombrios, mais carecem do anúncio vivo da alegria do Evangelho!
D. Jorge Ortiga, Arcebispo Primaz de Braga, na sua Mensagem para este Advento, destacava precisamente esta necessidade de irmos ao encontro, como Jesus, o Emanuel, que significa “Deus connosco”, vem para o nosso meio, para que assim possamos “redescobrir o nosso vizinho, o nosso colega de trabalho, o nosso familiar e intuir as suas necessidades materiais e espirituais”.
Nesta lógica, sejamos como os pastores de Belém e apressemo-nos a encontrar o Menino Jesus, presente e vivo na gruta da vida de todos os que nos rodeiam, sobretudo dos que mais sofrem. Sejamos também como os Reis do Oriente e levemos-Lhe presentes… o presente do Amor que d’Ele recebemos e que queremos oferecer a todos, o presente do perdão, da justiça, da verdade, da esperança, da alegria sem ocaso… o presente do que de mais doce podemos ser, num sorriso, num olhar, num gesto, numa palavra, num abraço!
No fundo, S. Paulo explica-nos bem este imperativo na sua carta aos Colossenses, pois recorda-nos que, “como eleitos de Deus, santos e predilectos, devemos revestir-nos de sentimentos de misericórdia, de bondade, humildade, mansidão e paciência, revesti-vos, acima de tudo, da caridade, que é o vínculo da perfeição”. (cf. Col 3, 12.14).
É este o grande desafio que vos deixo a todos, irmãos na fé em Jesus Cristo: façamos do Natal a grande festa do Amor que germina e viceja em nós, nas vidas de todos nós, para que “todos os confins da terra possam ver a salvação do nosso Deus” (cf. Is 52, 10)!
A todos um Santo e Feliz Natal!
Um Próspero e fecundo ano de 2015!
O Arcipreste
P.e Paulino Carvalho
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