sábado, 14 de dezembro de 2013

O caminho para a verdade...

A chuva que caía há dias parou finalmente nessa tarde. Um suspiro de alívio percorreu a turma toda. Os rapazes sabiam agora que o jogo de futebol há tanto ansiosamente esperado, poderia ter lugar e já não seria cancelado por causa do mau tempo.
- Bom, às três horas no campo de jogos, mas em ponto! - diz o Rui para o Pedro, ao irem juntos para casa no fim das aulas.
Pedro abana a cabeça e murmura alguma coisa incompreensível de cada vez que o Rui dá pontapés nas pedras do caminho para ensaiar golos. Tenta acertar num tronco, noutra pedra, ou até numa determinada folha de um ramo. Pedro já não suporta esta mania. É que o Rui tem tudo menos boa pontaria. As suas brincadeiras com as pedras já tinham causado aborrecimentos que chegassem. 
Rui achava que era precisamente por isso que devia treinar mais. Como se dar pontapés a pedras fosse de uma importância vital! Ainda Pedro não tinha acabado de pensar e já se ouvia o barulho de vidros partidos: a última pedra do Rui tinha voado direitinho à janela da entrada do Sr. Gilberto. Pedro ficou a olhá-la petrificado.
- O melhor agora é fugir! - ouviu Rui sibilar. 
E, com um grande salto, o autor da asneira desapareceu a correr pela rua abaixo. Pedro ainda estava a olhá-lo, confuso, quando sentiu que alguém o agarrava pela gola e o puxava com força. À sua frente, furioso e ofegante, estava o senhor Gilberto.
- Até que enfim que te apanhei, rapazinho! Espera lá, que te vou entregar já ao teu pai, e vais ver o que te vai acontecer!
Às três horas em ponto, Rui apareceu no campo de jogos mas, por mais que procurasse Pedro, não o encontrou. “Afinal sempre o apanharam”,- pensou o Rui - “e, ou assumiu ele a culpa, ou não o deixaram falar. Já é costume. O pai dele, às vezes, é muito severo.
Rui ficou de pé, na tribuna, a olhar para o campo vazio, em baixo. Combinavam quase sempre encontrar-se uma hora antes, para arranjarem um bom lugar. Mas, de um momento para o outro, o Rui perdeu o entusiasmo pelo jogo. Pensava no vidro da janela, no Pedro, e a má consciência atormentava-o. Devagar e de cabeça baixa, abandonou o campo e encaminhou-se, hesitante, para a casa dos pais do Pedro. Foi o pai em pessoa que lhe abriu a porta. Irado como estava, nem sequer deixou o Rui falar, dizendo-lhe asperamente:
- É inútil, rapaz! O Pedro está fechado no quarto, de castigo a fazer os trabalhos de casa… Ele que te conte tudo na segunda-feira, na escola. Já só faltam dois dias e meio. 
E voltou para dentro, fechando a porta com força. Rui voltou a tocar à campainha insistentemente e, desesperado, acabou por bater à porta com os punhos. Não podia aceitar uma injustiça daquelas. Mas nada se mexeu dentro de casa. Os pensamentos atropelavam-se-lhe na cabeça. “Muito bem”, - pensava ele, - “então vou contar-lhe a verdade pelo telefone. E se ele também não me deixa falar pelo telefone?” De repente, Rui tem uma ideia e volta a correr para casa. A mãe ainda não tinha regressado do trabalho. Procurou papel de carta e um envelope, escreveu a toda a pressa umas linhas no papel e levou a carta à estação dos correios mais próxima. Mostrou ao empregado o dinheiro que lhe sobrava da semanada e perguntou:
- Chega para mandar uma carta por correio expresso para a cidade?
- Chega e sobra, rapaz.
- E a carta é entregue agora mesmo?
O empregado olhou-o sorrindo e respondeu:
- Há fogo? Não tenhas medo, que estás com sorte. A carta pode chegar ao destino em meia hora. Excepcionalmente!
O Rui entregou a carta, feliz. Uma meia hora mais tarde, o pai do Pedro abria uma carta, entregue por um estafeta motorizado. E, admirado, leu:
“Caro Sr. Pinto,
Venho, por este meio, provar-lhe que a verdade afinal consegue entrar em sua casa. Fui eu que parti o vidro da janela e vou pagá-lo com a minha próxima semanada. Espero pela resposta em frente à sua casa. Com os meus cumprimentos Rui.”
A resposta que o pai do Pedro mandou ao Rui, pesava quase 40 kg e vinha a rir-se. O pai tinha mandado o Pedro. Assim que viu o amigo sentado à espera na soleira da porta, disse:
- Rui, tu és o maior maluco do mundo! O que tu fizeste… bem, nunca hei-de esquecer.
- Ora - resmungou Rui - não fales tanto, senão ainda perdemos a segunda parte do jogo.

(Desconheço o autor)

Para Reflectir:
Sinceridade - Adoptar o princípio de mentir sempre que convém atrai a desconfiança dos demais e leva à solidão. Quem engana acabará por ser enganado, porque quem semeia joio não pode colher trigo. Nada é mais importante do que uma consciência tranquila, embora o caminho da verdade nem sempre seja fácil.








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