terça-feira, 14 de junho de 2016

Por que a terceira idade pode ser, sim, a melhor idade

Com três filhos, cinco netos e uma bisneta sou um homem feliz. (Ela não é linda?). - diz Ethevaldo Siqueira. É claro que tenho problemas, como milhares de outros idosos que enfrentam o desafio de viver neste País que amamos, mas que é tão complicado e ainda tão pouco desenvolvido cultural e eticamente.

Dou-lhes aqui meu depoimento absolutamente sincero: aos 83 anos, vivo a melhor fase de minha vida. Rio-me daqueles que duvidam da minha palavra e se apavoram com o envelhecimento. Ao fazer o balanço das vantagens e das desvantagens da terceira idade, percebo (no meu caso pessoal) que o saldo é largamente positivo. E vou detalhar um pouco mais as razões dessa conclusão.
Sinto que hoje sou um ser humano muito mais feliz e mais realizado do que os imaturos, radicais e inexperientes que consideram estupidez achar que a terceira idade possa ser a melhor idade. Não generalizo essa possibilidade, mas, com base na minha experiência pessoal, dou-lhes o meu depoimento. Confiram as minhas razões:

• Hoje, entendo melhor a humanidade.
• Tolero mais as pessoas, embora tenha muito maior consciência das minhas limitações.
• Adoro o meu trabalho profissional, como jornalista, professor, palestrante e consultor independente.
• Assim, sinto grande alegria em poder trabalhar até 8 ou 10 horas por dia, desde 1950, há 66 anos, portanto.
• Por trabalhar mais, ganho um pouco mais e posso viver com mais dignidade, por não depender da aposentadoria miserável que recebo.
• Posso desfrutar o melhor da vida.
• Viajo quatro vezes por ano pelo mundo para trabalhar e consigo esticar um pouco para descansar.
• Adoro comer e saborear os melhores pratos e os melhores vinhos, quase sem nenhum excesso.
• Tenho imenso prazer em ouvir diariamente a melhor música do mundo e dar a minha contribuição política.
• Eu teria mais uma dúzia de razões para acrescentar aqui, mas acho que estas bastam, como exemplos.

Digo tudo isso porque li no Facebook um pequeno texto de uma colega a quem prezo muito. Para a minha amiga, “imbecil é quem diz que esse período (a terceira idade) é a melhor idade”. Não me senti ofendido com a carapuça de “imbecil” que foi colocada na minha cabeça por simples divergência de opinião. Discordo dessa visão tão extremada. E tudo que escrevo aqui é para demonstrar que a terceira idade pode ser algo extraordinário. Eis aqui as minhas razões.

DEZ COISAS QUE PODEM DAR CERTO

Vou resumir a seguir, de forma bem sintética, as razões que podem fazer com que eu, você e quase todas as pessoas possamos nos chegar à “melhor idade” quando muitos se sentem acabados e decadentes.

1. APRENDA A ENVELHECER. A melhor idade resulta da experiência acumulada pelo ser humano, em conhecimento e sabedoria, no sentido de saber viver melhor. O que é essencial para se chegar a este resultado tão positivo consiste, a meu ver, em aprender a envelhecer. Nesse sentido sinto-me privilegiado, porque acho que aprendi a envelhecer.

2. ACUMULE CULTURA E SABEDORIA. De forma bem explícita: cultura e sabedoria são acumulativas. O nosso cérebro assemelha-se a um celeiro em que se acumula a experiência adquirida ao longo da nossa vida, como saldo de tudo que aprendemos com os nossos erros e os nossos acertos.

3. FAÇA A MAIS DURA AUTOCRÍTICA. Seja implacável consigo mesmo. Ponha em dúvida  a sua própria capacidade, a sua pretensa inteligência e talento. Nunca se julgue um génio (mesmo que os amigos e bajuladores repitam esse elogio todos os dias). Só acredite depois de receber o Prémio Nobel. Você não evoluirá se não fizer a reavaliação diária da sua existência, do seu trabalho, dos seus problemas e desafios. Sem essa revisão permanente de metas e objetivos, você tenderá a sentir-se frustrado, sem perspectiva. E uma advertência: essa autocrítica permanente nada tem de humilhante. Pelo contrário, ela dá-nos uma sensação de confiança e de capacidade de aperfeiçoamento permanente.

4. ARREPENDA-SE DOS SEUS ERROS. Conheço pessoas que insistem em proclamar que não se arrependem de nada do que fizeram na sua vida. Pobres diabos. De duas, uma: não têm a menor autocrítica ou julgam-se perfeitos, verdadeiros santos. Da minha parte, confesso que me arrependo, todos os dias, dos erros que cometi ao longo da vida, no ano passado ou a meia hora atrás.

5. DO QUE ME ARREPENDO. Arrependo-me de mil coisas que fiz na minha vida. De ter sido muito radical na juventude. De ter sido muitas vezes pretensioso quando aprendia um pouco mais do que a média das pessoas. De ter sido arrogante com aqueles que me enfrentavam sem muito preparo. De ter sido cruel e arrogante com os meus interlocutores. Mas, bendigo as lições que recebi em que me senti castigado e até humilhado por outros, mais capazes ou mais cultos do que eu. Em síntese, ter plena consciência dos nossos erros é condição essencial para o aperfeiçoamento permanente do ser humano. Equivale a um salto psicológico e espiritual.

6. CUIDE DA SUA SAÚDE. OBSESSIVAMENTE. A saúde na terceira idade depende de como vivi e dos cuidados pessoais que tive desde a infância até hoje. Velhice sem saúde ou sem qualidade de vida é um inferno prolongado. Nunca fui um modelo nessa área. Fumei dos 20 aos 40 anos. Da juventude até aos 40 anos, cometi excessos gastronómicos, de diversões e de trabalho. Felizmente, abandonei o cigarro ainda em tempo de salvar meus pulmões. Quanto à forma física, só há três anos é que me convenci de que devia reeducar  os meus hábitos alimentares e eliminar DEFINITIVAMENTE o sobrepeso, mas de forma lenta e contínua. É o que faço há 26 meses.

7. RELACIONE-SE BEM. Vejam o que acontece, com tanta frequência, aqui nesta rede social, nos comentários ou nas discussões. Os imaturos são os que dão um show de estupidez, com o seu prazer idiota de sempre “chutar o pau da barraca” em qualquer debate. Querem impressionar a plateia por sua ousadia verbal (ou melhor, sua ignorância). Se você chegou até aqui, talvez não precise muito deste conselho. Mas nunca é demais lembrar que o nosso relacionamento com qualquer interlocutor deve ser marcado por muito mais polidez, equilíbrio, paciência e capacidade de reflexão permanente.

8. A VIDA É A GRANDE ESCOLA. Aprender com a vida é uma conquista que não tem preço. Em especial quando aprender a ser mais simples, mais humilde e a respeitar o nosso semelhante, sempre. Ensina-nos a ser tolerantes e polidos, sempre e cada vez mais, com as pessoas das quais discordamos. Mostra-nos que é possível vencer os preconceitos de todos os tipos.

9. NÃO RESISTA AO HIDRÓFOBO. Se toda a paciência que sugiro não for suficiente, não queira revirar as ofensas e xingamentos. Em lugar de oferecer a outra face, que é a mais bela utopia cristã, eu aconselho-lhe: caia fora, você estará atirar pérolas aos porcos.

10. MEU PARADIGMA. O meu modelo inesquecível, o meu melhor exemplo de vida perfeita na terceira idade foi Alceu de Amoroso Lima, o Tristão de Ataíde (1893-1983). Com quase 90 anos, além da sua cultura ímpar, esse brasileiro enfrentou a ditadura militar, fez palestras e escreveu artigos corajosos e irrespondíveis. Como dizia, com bom humor, um professor da USP, meu amigo, “não se fazem mais intelectuais antigamente. Em especial, como Alceu de Amoroso Lima”.


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